domingo, 26 de abril de 2015

Falling...

O relógio da estação marcava as 7.30h, restavam 15 minutos de ansiedade em que o coração batia expectante pela partida e o raciocínio exigia ficar.
À primeira chamada, entrou no comboio em passo lento a contrastar com o bater acelerado no seu peito. Uma lágrima reprimida rolou finalmente pelo rosto; o comboio partiu e já não podia voltar atrás.
Aquela viagem era quase como uma analogia à sua vida no momento, sabia que jamais recuperaria a sua vida anterior, sabia ter atingido o ponto de não retorno, só desconhecia o que a aguardava no fim da linha.

E era lá, na estação de chegada, que ele a esperava. Na sua aparente calma, passeava sobre os ténis preferidos.
Soou o aviso de chegada, o ritmo cardíaco intensificou-se mas a expressão do seu rosto permaneceu ligeira. Estava quase a ir embora quando a avistou, seria de esperar que não a reconhecesse, vira-lhe somente o rosto em fotografias que, honestamente, a faziam ter bem melhor aspeto ao vivo. Sorriu ao observar a dissonância entre a sua aparência frágil e a determinação do seu caminhar. Sempre fora bom a perceber as pessoas simplesmente pelos seus gestos e tinha de confessar que aquela mulher o intrigava: o rosto transmitia a expressão mais serena, a postura era rígida e os passos seguros. Quantos anos teria levado a construir aquela imagem. Aquela não era a menina triste que falara com ele ao telefone na noite anterior que o fizera revoltar-se e desejar tirá-la dos braços do papão. Ela personificava a confiança que sempre procurara numa mulher, mas nunca tinha visto.
Paralisado, viu-a sentar-se e procurar algo na bolsa, ela tirou o telemóvel e o seu começou a tocar quase no imediato, vê-la enquanto a ouvia provocou-lhe uma estranha sensação de realidade, ela existia, não era produto da sua imaginação.

- Não me fizeste vir a Lisboa para me deixares sozinha na estação, pois não? - A sua voz parecia diferente agora.
- Estou a observar-te desde que chegaste, mas com alguma dificuldade em mexer-me.
Ela começou a procurar o seu interlocutor, quando o encontrou sorriu e aquele trejeito no lábio fê-lo tremer. Que raio de mulher era aquela?

Quando se aproximou para a beijar na bochecha e sentiu o seu perfume percebeu-se invadido pelo desejo de se afundar no seu corpo perfumado, afastou aquele pensamento o mais rapidamente que conseguiu. Levou a mão ao seu rosto para lhe tirar os óculos escuros que o impediam de lhe ver os olhos, ela baixou ligeiramente o rosto mas não o impediu. Foi um choque encontrar as marcas de uma noite de lágrimas, os seus olhos verdes pareciam engolidos numa dimensão de dor. E ela não se controlou mais. Abraçou-a com toda a sua força e depois apercebeu-se de que estaria a magoa-la, aquele abraço era um misto de compreensão e raiva. À medida que o soluçar dela no seu peito se tornava mais intenso, mais sentia vontade de torna-la sua, mesmo que o preço a pagar fosse demasiado alto.
- Vá, vamos sair daqui - devolveu-lhe os óculos.
Entraram no carro e não trocaram uma única palavra durante o que lhes pareceu uma eternidade, nenhum dos dois parecia querer interromper o silêncio. Ela deu o primeiro passo:
- Onde me levas?
- Ao céu, minha querida - e olhou-a de relance, sorrindo. 

Sem comentários:

Enviar um comentário